quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Minha casa

Eu quero uma casa amarela
Que tenha um caminho de girassóis para receber os amigos
Que tenha uma lareira
perto de um som que toque MPB
Que tenha cheiro de sopa de cebola com cheiro verde
e lembre um sorriso apaixonado
Que seja limpinha e organizada
mas que tenha bagunça de criança aprendendo
Que o perfume que sai junto com a neblina do chuveiro
se espalhe por ela toda
Que tenha um tapete felpudo
Específico para rolar, fazer e receber cócegas
Que da minha janela eu possa ver
chuva molhando o quintal
Que tenha duas portas
Uma na frente
para que entre o sol
E uma nos fundos
que se mantenha sempre fechada
para que nada disso de bom saia dela
porque nada de ruim vai entrar
então não terá precisão de sair.

Caminhos que percorri até voltar pra casa

Você estava lá e eu aqui;
Tão perto e tão longe.
Eu me mantive aqui, mas você já estava ali, ao alcance dos olhos e das palavras (às vezes arredias).
Você ficou mais próximo. Não pela estrada principal, mas por caminhos alternativos.
Eu até torcia para que estes caminhos te levassem para longe, e te trouxessem alegrias. Mal sabia eu que eles levariam à estrada principal da minha vida.
De repente tudo ficou longe. Eu de você, você de mim.
Mas ai surgiu uma bifurcação e você estava lá, então, trombamos.
E a agitação desse acidente trouxe outros. Pela impaciência e pelas feridas, até um acidente grave, mas necessário.
E você ficou mais longe do que nunca. Só não deu pra esquecer aquele caminho curto, mas tão lindo que havíamos percorrido juntos.
Atravessei riachos muito tranqüilos. Tranqüilos em excesso. Passei por pontes. Pontes podres que rangiam enquanto eu as atravessava. Conquistei paraísos, comi maças envenenadas.
Pensei que tivesse caído e que tivessem me resgatado, mas só tinham me mudado de poço.
Alguns poços eram agradáveis, arejados, mas não me permitiam enxergar a luz do sol que eu sempre tanto gostei.
E eu comecei à vê-lo em meus sonhos, delírios, não sei. De alguma forma você se manteve presente, mas era só uma lembrança. Boa lembrança, que não doía mais.
E você quis reaparecer quase todos os dias, mas o poço era fundo, e lá permaneci. E o poço começou a encolher, ou eu que comecei a crescer tanto dentro dele, que já me causava fobia. As paredes iam me comprimir.
E tão rapidamente que mal pude perceber, tinha sido expelida, cuspida para fora daquele que me causava apertos na alma. Cuspida direto em seus braços, em seu olhar. Aí percebi que tinha voltado pra casa.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Sou assim, e daí?

É verdade
Sou egoísta
não gosto de ser contrariada
Tenho defeitos sim, ué
E daí?
Não é por isso que não vou pro céu
Ainda tenho qualidades que julgo serem das melhores
Me comove um mendigo comendo lixo
E não fico quieta, comovida, como a maioria
Faço a minha parte
para me sentir mais humana
e não estes robôs nos quais nos transformamos
Sou manhosa e gosto de colo sim
Falem mesmo
Sou filha única
Me taxem como bem entenderem
e quiserem
mimada? pode ser
mas sei retribuir
você sabe?
Você, que é tão forte
tão seguro de si
sabe dar a mão a quem precisa?
consegue não rir de quem sofre?
ou prefere parecer forte?
quem é mais egoísta?
Quem vai pro céu?

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Por que alface é alface, mamãe?



Me apavora a maturidade precoce das crianças.
Hoje, na faixa dos sete, oito, nove anos há ainda um resquício de ingenuidade, mas que já se mistura com a malícia.
Na minha época (e já falo me sentindo ultrapassada) as crianças sabiam muito bem como as coisas funcionavam, que cegonhas e sementinhas eram contos da Carochinha, mas não se falava com tanta falta de pudor.
Não me julgo careta, mas sou a favor do tempo. Cada coisa ao seu tempo. E o tempo de brincar, de se descobrir, de perguntar... está se perdendo.
Fora a pressão para que os pequenos façam futebol, natação, inglês, mandarim, piano, flauta doce, aula de canto, teatro, ballet, informática, e inúmeros cursos, além de que passem no vestibular aos 10 anos.
Há anos atrás Lilica Ripilica era uma marca famosa e cara, que somente aparecia como presente, ou em datas especiais. Hoje é uma imposição nos jardins de infância.
Juro que não sou radical, mas meu filho não vai comemorar o aniversário de um ano dele no MacDonald’s. Vou permitir a ele que tenha cinco anos com cinco anos. Ele vai ter pai e mãe o corujando sem vergonha ou medo de que ele se transforme em algo que a sociedade não quer.
Ele vai pintar as paredes e quebrar coisas, e eu vou brigar com ele. Ele vai ficar de castigo algumas vezes, e vai doer mais em mim do que nele as palmadas que eu der. Mas quando ele perguntar “Por que alface é alface, mamãe?” eu vou ser a mulher mais feliz e paciente do mundo tentando explicar algo que não tem resposta.
Eu permitirei e incentivarei meu filho a fazer perguntas idiotas, que hoje as crianças têm medo de fazer, por parecerem ultrapassadas, mesmo que não tenham a mínima noção do que isso significa, nem do que é alface.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

É o amor e não o tempo...

... que cura a dor

A mulher de preto passou
Com sua dor
Ela conheceu o amor
e o viveu
mas perdeu
O amor é assim
Te dá cor
torpor
e dor
sempre assim
E ela saiu sem o chão
embaixo dos pés
E achou que se curou
tão rápido
mas não sabia
que dor de amor não se cura assim
Aliás
não se cura nunca
quando é amor
Então ela apenas se anestesiou
de dor
de amor
de paixão
E viveu uns tantos por aí
mas era uma bela ilusão
E todos os dias quando acordava
Sozinha ou não
Na sua cama
ou não
entendia
Ela até havia se esquecido da promessa
que havia feito
ou da premonição que tinha tido
E um dia
Quando seus pensamentos vagavam
E ela se esquecia
ou não permitia
O amor ressurgiu
Ela não se lembrava dele daquela forma
Nem de nenhuma outra
Ela não lembrava
Ela se permitiu apagar
Mas ele voltou
E a mulher de preto
voltou às ruas com seu traje colorido